sábado, 2 de agosto de 2014

O machismo porco chauvinista escondido na brodagem - prestenção


Adoro os textos tanto da juliana cunha quanto do Chico Sá.  Só que o Chico não se admite machista e é.
vamos ler que texto massa:
"Caso se sinta incompreendida, Xico Sá te dará um abraço. Não se sinta feia, Xico Sá está aqui para te dar colo dizendo que macho que é macho não sabe a diferença entre estria e celulite. Macho que é macho liga quando promete, não enxerga rugas, é incapaz de notar que você engordou cinco quilos. O que são cinco quilos na grande ordem das coisas? O Homem de Verdade prega a imaterialidade dos cinco quilos. Com a cabeça nas grandes questões da humanidade ou na concretude do trabalho braçal, não consegue se ater a esse tipo de pequeneza.
É incrível a lista de itens cotidianos que um Homem de Verdade não enxerga, não compreende, não sabe diferenciar. Sua tolerância assume a forma de uma completa falta de percepção. Seus problemas, moça, suas inseguranças, não são fruto de processos históricos concretos, são apenas miragens. De repente você não é uma adulta que percebe o quanto a sociedade é exigente com você (especificamente com você) e que se frustra diante disso: você é uma criança, moça, uma criança boba vendo chifre em cabeça de cavalo. Tudo que você precisa é de um Homem de Verdade para lhe assegurar que seus fantasmas não existem, pois ele não pode vê-los. A lente da razão não pode vê-los, moça, por isso deixe de bobagem, deixe que seu homem te diga com que se preocupar, deixe que ele te separe por grupinhos e que te dê apelidos no diminutivo como “boterinha”, caso você seja gorda, ou “prozaquinha”, caso faça um gênero doidinha.
Xico Sá entende as mulheres. Xico Sá infantiliza as mulheres ao assumir a posição do homem que as entende. Porque é difícil entendê-las. Entender quem não sabe se expressar é uma arte que uns poucos homens sensíveis dominam. Precisamos desses porta-vozes para traduzir o que sentimos. Somos mulheres, somos só sentimento, não elaboramos as coisas, ou elaboramos mal. Precisamos de homens sensíveis que peguem nossos sentimentos confusos e transformem em conceitos inteligíveis, em regras de conduta. Precisamos que esses mesmos homens nos digam quais dos nossos sentimentos são legítimos e quais são paranoia.
Xico Sá pensa os gêneros como coisas tão separadas que, segundo ele, homens (de verdade) simplesmente não conseguem enxergar dados concretos expostos pelas mulheres. Homem que é Homem não vê celulite. A celulite é um dado da realidade. Pode ser fotografada, apalpada, tem aparência e textura definidas, tem classificação médica. É um depósito de gordura e tecido fibroso que provoca irregularidades na pele que o reveste. A celulite é ainda uma construção publicitária: surgiu enquanto problema na França, no começo da década de 1970, ápice do movimento feminista. Surgiu para lembrar as mulheres que você não deve tentar melhorar o mundo quando não consegue sequer melhorar sua bunda. Olhe para o seu próprio rabo. Lembre daquele provérbio que diz: quando pensar em mudar o mundo, dê uma volta em sua própria casa. Quando pensar em mudar o mundo, torne-se um neurótico enclausurado.
Celulites são furinhos, estrias são listrinhas. Muitos homens têm estrias já que elas são um rompimento das fibras elásticas que pode acontecer, por exemplo, durante um crescimento repentino na puberdade. Poucos homens têm celulite, é uma questão hormonal. Celulite é uma mesquinharia. Espíritos elevados não enxergam algo tão pequeno. Eu achava que em 2014 um homem normal era aquele que sabia exatamente o que era uma celulite, conseguia enxergá-la perfeitamente e lidava com sua existência do mesmo modo como eu venho lidando com os pelos nas narinas de meus namorados desde que passei a ter namorados (e que eles passaram a ter pelos nas narinas). Eu não preciso glorificar o pelo na narina. Não preciso negar sua existência, tampouco dizer que nunca reparei. Não preciso dizer que não sei a diferença entre um pelo e um cravo. Homem nenhum vai me dar um biscoito e dizer que nunca encontrou uma mulher tão legal na vida caso eu diga algo assim. Eu lido com esses pelos. Eles permanecerão lá quer eu os ache nojentos ou lindos. Por isso eu não preciso achá-los nojentos. Nem lindos. E nunca me ocorreu que o homem ao meu lado pudesse ser desmerecido pelo que traz dentro do nariz. Porque eu fui ensinada a enxergar homens como pessoas, não como objetos. Isso não é um mérito meu, nem da minha educação familiar específica. Eu não enxergo homens como pessoas porque sou bacana, um espírito livre. Eu enxergo homens como pessoas porque isso é fruto do percurso que fizemos até aqui enquanto sociedade.
Homens que enchem a boca para dizer que adoram celulite, que curtem uns pelos, são idiotas condencendentes. O cerne do problema é justamente você achar que deve ter e expressar opinião sobre cada aspecto do corpo de uma outra pessoa. Melhor: de uma categoria de pessoas. Você não tem que opinar sobre isso. Se você tem uma preferência específica sobre um aspecto do corpo da mulher com quem está transando, exponha isso para ela. Se tem várias preferências específicas, exponha isso ao seu analista. Mas não opine sobre como mulheres em geral deveriam manter seus pelos, ou sobre a relação que elas deveriam estabelecer com suas celulites. Fique na sua.
Não enxergar as coisas, não saber a diferença entre elas, não ligar para elas, nada disso é empatia, nada disso é mérito. E não é a empatia de um grupo historicamente privilegiado que vai impulsionar mudança alguma. Não é minha empatia pelos negros que reduz o racismo. Não é minha bondade ao “abrir mão de privilégios” que faz o bondinho da história andar. Não foram textos na internet ensinando o opressor a manerar que nos trouxeram até aqui. Tenho achado muito engraçados uns textos recentes sobre “como homens podem ajudar o feminismo” (spoiler: não podem). Uma das dicas costuma ser: “abrindo mão de seus privilégios”. Ninguém abre mão de privilégio. Ninguém quer ou mesmo pode fazer isso. Um privilégio histórico não é aquele ⅓ do apartamento de papai que você abdicou em favor do irmãozinho desajustado. Eu não abro mão de nenhum dos meus privilégios como branca: são os negros que vêm arrancando esses privilégios de mim, como tem que ser. Me ressinto quando vejo meus privilégios serem arrancados, fecho a mãozinha. Se fico caladinha é porque uma das conquistas do movimento negro foi fazer com que a exposição desse ressentimento fizesse de mim uma idiota no meu meio social. Eu posso perder coisas com isso, amigos, trabalhos. Então fico calada. Um dia, homens como Xico Sá também acharão melhor ficar na deles. Mas hoje não. Hoje eles são amigos dasmulheres e expoentes da ala feminismo de boteco da imprensa brasileira. Posam entre as pernas de uma gostosa enquanto te asseguram que vai dar tudo certo, moça, inclusive aquele seu rolo com o demente que não vê celulite.
obs . nao concordo com tudo óbvio mas vou comprar o livro de Juliana.
http://julianacunha.com/blog/2014/08/01/xico-sa-te-abraca/

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